
1. Os Mártires, testemunhas e mestres de fé
Os nossos dias exigem muitas coragem
para viver. Há tantos motivos de preocupação e tantas angústias, mesmo
se, no fundo, é também belo viver neste tempo, tão cheio de esperanças
de um futuro mais sereno e mais humano.
Muitos arriscam a vida, também, para defender suas idéias e sua liberdade, e não faltam exemplos luminosos de heroísmo.
Muitos arriscam a vida, também, para defender suas idéias e sua liberdade, e não faltam exemplos luminosos de heroísmo.
O cristão é levado, igualmente, a
arriscar para permanecer tal. Não será verdade, talvez, que em algumas
partes da humanidade ainda existe opressão e perseguição, levando os que
desejam permanecer fiéis a Cristo a viverem escondidos, como no tempo
das perseguições? E, muitas vezes, quando descobertos, pagam com a vida.
Mesmo onde não se chega a tanto, há
sempre uma perseguição latente: és boicotado, colocam-te mil obstáculos,
és ridicularizado só porque queres viver seriamente como cristão!
Essa perseguição, entretanto, não é
novidade. Desde quando Cristo foi colocado numa cruz, teve início uma
longa história que já dura dois mil anos: a história dos mártires
cristãos, que jamais conhecerá a palavra “fim”. Ele disse: “Se
perseguiram-me, perseguirão também a vós”. É uma nota característica e
perene da Igreja de Cristo: ela é Igreja de Mártires.
Existem, porém, algumas páginas nessa
história que merecem uma grande atenção, e são as que se referem aos
mártires dos primeiros séculos da Igreja Cristã, quando o sangue foi
derramado em grande abundância.
É muito útil, e até necessário, voltar
a essa história (mas atenção: é história verdadeira, não lenda;
história documentável, não fábulas ou mitos), porque é uma história que
se torna escola: nela aprenderemos a ser também intrépidos na profissão
da fé e corajosos na superação das provas do nosso martírio, qualquer
que ele seja
2. Os Atos dos Mártires
Os Atos dos Mártires são documentos oficiais e os mais antigos da Igreja das perseguições.
São textos contemporâneos aos
acontecimentos narrados. São as atas dos processos dos Cristãos,
chamados “Atos proconsulares” porque, em geral, o magistrado era um
procônsul; são as narrações de testemunhas oculares; são as “paixões
epistolares”, isto é, cartas circulares sobre os mártires, enviadas por
uma Igreja às demais comunidades cristãs; e as “paixões narrativas”,
ditadas em parte pelos próprios mártires.
Os Atos dos Mártires são reportados,
na maior parte, por Eusébio de Cesaréia (3º-4º século) em “De mortibus
persecutorum”; mas também nas Cartas e no tratado “De Lapsis” de São
Cipriano (3º século); nas Apologias dos escritores gregos e nos
panegíricos pronunciados pelos grandes oradores cristãos do Ocidente,
como Ambrósio, Agostinho, Máximo de Turim, Pedro Crisólogo, e do
Oriente, como Basílio, Gregório de Nissa e João Crisóstomo.
Os Atos dos Mártires eram lidos no dia
de suas festas, durante a celebração eucarística. Com efeito, a
memória, a lembrança do mártires, fundamenta-se no memorial de Cristo,
porque a paixão do mártir renova a única paixão do Senhor, da sua morte e
ressurreição.
3. Eusébio de Cesaréia é a principal fonte dos Atos dos Mártires
Nascido em Cesaréia da Palestina pelo
ano 265 e educado na escola do douto Pânfilo, Eusébio recebeu uma sólida
formação intelectual, sobretudo histórica. Eleito bispo de sua cidade,
foi o homem mais erudito do seu tempo. Escreveu muitas obras de
teologia, exegese, apologética, mas a sua obra mais importante foi a “História eclesiástica”, em 10 volumes, que são o fruto de 25 anos de pesquisa histórica, contínua e apaixonada.
Ele narra, nos 7 primeiros livros, a
história da Igreja das origens até 303. Os livros 8º e 9º referem-se à
perseguição iniciada por Diocleciano em 303 e concluída, no ocidente em
308, tendo continuado no oriente com Galério, até o Edito de tolerância
de 311 e à morte de Maximino (313). O livro 10º descreve a retomada da
Igreja até à vitória de Constantino sobre Licínio e à unificação do
império (323).
Antes ainda dessa obra, Eusébio tinha recolhido e transcrito na “Coleção dos antigos Mártires”,
uma vasta documentação (atos dos processos de mártires, paixões,
apologias, testemunhos de indivíduos e comunidades) sobre os mártires
anteriores à perseguição de Diocleciano; o livro foi perdido, mas
Eusébio tinha retomado o tema em parte na “História Eclesiástica”.
Poupado pela perseguição de
Diocleciano (303-311), Eusébio foi dela uma testemunha de importância
excepcional, porque viu pessoalmente a destruição de igrejas, as
fogueiras de livros sagrados e muitas cenas selvagens de martírio na
Palestina, na Fenícia e até na distante Tebaida do Egito, deixando-nos
de tudo, uma comovente memória de grande valor histórico.
Apesar de suas lacunas e erros, a
“História Eclesiástica” continua “a obra histórica mais conhecida e
digna de fé e, muitas vezes, a única fonte supérstite de informação”
(Angelo Penna, “Enciclopedia Cattolica”, Cidade do Vaticano, 1950, vol.
V, pp. 842-854).Apresentamos, em seguida, uma brevíssima coleção de fatos históricos, uma pequena antologia tirada dos textos originais dos autores indicados,
traduzidos com fidelidade. Conheceremos assim como os nossos primeiros
irmãos na fé sabiam sofrer e enfrentar por Cristo a tortura e a morte.
O martírio é uma constante de toda a Igreja
Os mártires recordados nesta breve coleção pertencem a séculos diversos, a diferentes categorias de pessoas, extrato social e nacionalidade; representam a Igreja inteira. São homens e mulheres, ricos e pobres, velhos (Simeão tem 120 anos) e jovens (os 7 “filhos” de Sinforosa); eclesiásticos (os bispos Simeão, Policarpo, Acácio, Ságaris; o sacerdote Piônio; os diáconos Êuplio e Papilo) e leigos (o senador Apolônio, o comerciante Máximo, o jardineiro Conão, os legionários “quarenta mártires de Sebaste, o centurião Marino, as mães de família Sinforosa e Agotonice); nobres, como Apolônio, e gente comum do povo, como Conão; muitas vezes cristãos cujos nomes ficaram desconhecidos.
Todos testemunharam a própria fidelidade a Cristo com o sacrifício cruento da própria vida.
Os Atos dos mártires contam a história mais verdadeira da Igreja das origens.
3.1. Os mártires de Alexandria (Egito)
“De uma carta de Filéias aos habitantes de Tmuis”
Filéias, bispo da Igreja de Tmuis, cidade a leste de Alexandria, era famoso pelos cargos civis que ocupou em sua pátria, pelos serviços prestados e também pela cultura filosófica. Jovem, nobre, riquíssimo, tinha mulher e filhos, e parece acertado que fossem pagãos. Da prisão, escreveu uma carta em que descreve os massacres de cristãos, que assistiu pessoalmente, e exalta a coragem e a fé dos mártires. Padeceu o martírio por decapitação em 306.
”Fiéis a todos esses exemplos,
sentenças e ensinamentos que Deus nos dirige nas divinas e sagradas
Escrituras, os bem-aventurados mártires que viveram conosco, sem sombra
de incertezas, fixaram o olhar da alma no Deus do universo com pureza de
coração; aceitando no espírito a morte pela fé, responderam firmemente
ao chamado divino, encontrando o Senhor nosso Jesus Cristo, que se fez
homem por amor de nós, para cortar o pecado pela raiz e dar-nos o
viático para a viagem à vida eterna.
O Filho de Deus, com efeito, embora
sendo de natureza divina, não quis valer-se da sua igualdade com Deus,
preferindo aniquilar-se a si mesmo, tomando a natureza de escravo e
tornando-se semelhante aos homens, como homem humilhou-se até à morte, à
morte de cruz (Fl 2,6-8).
Os mártires, portadores de Cristo,
aspirando, pois, aos mais elevados carismas, enfrentaram todo sofrimento
e todo gênero de torturas imaginados contra eles, e não só uma, mas até
mesmo uma segunda vez; diante das ameaças, com que os soldados
competiam entre si no lançar-se contra eles com palavras e atitudes, não
retrataram a própria convicção, porque “a caridade perfeita afasta o
terror” (1Jo 4,18). Que discurso seria suficiente para narrar suas
virtudes e sua coragem diante de cada prova?
Entre os pagãos, qualquer um podia
insultar os mártires e, por isso, alguns batiam neles com bastões de
madeira, outros com vergas, outros com chicotes, outros com cintos de
couro, outros ainda com cordas. O espetáculo dos tormentos era muito
variado e extremamente cruel.
Alguns, com as mãos amarradas, eram
pendurados numa trave, enquanto instrumentos mecânicos puxavam seus
membros em todos os sentidos; os carnífices, seguindo a ordem do juiz
aplicavam no corpo todo os instrumentos de tortura, não só nas costas,
como era costume fazer com os assassinos, mas também no ventre, nas
pernas, nas faces. Outros, pendurados fora do pórtico, por uma só mão,
sofriam a mais atroz das dores pela tensão das articulações e dos
membros.
Outros eram amarrados às colunas, com o
rosto voltado um para o outro, sem que os pés tocassem o chão, e pelo
peso do corpo as juntas eram necessariamente esticadas pela tração.
Suportavam tudo isso não só enquanto o
governador se entretinha a falar com eles no interrogatório, mas por
pouco menos de uma jornada. Enquanto o governador passava para examinar
os demais, ordenava aos seus dependentes que olhassem atentamente se por
acaso, alguém, vencido pelos tormentos, acenasse ao cedimento, e
impunha que se lhes estivesse inexoravelmente por perto, também com as
correntes e quando, depois disso, tivessem morrido, puxassem-nos para
baixo e arrastassem-nos pela terra.
Essa, de fato, era a segundo tortura,
pensada contra nós pelos adversários: não ter nem sequer uma sombra de
consideração por nós, mas pensar e agir como se já não existíssemos.
Houve também aqueles que, depois de terem padecido outras violências,
foram colocados no cepo com os pés separados até ao quarto furo, de modo
que necessariamente ficavam de costas no cepo, pois não podiam ficar em
pé por causa das profundas feridas recebidas em todo o corpo durante o
espancamento.
Outros, ainda, jogados por terra,
jaziam subjugados pelo peso das torturas oferecendo, de modo bem mais
cruel aos espectadores, a visão da violência feita contra eles, porque
traziam as marcas das torturas no corpo todo.
Alguns, nessa situação, morriam em
meio aos tormentos, cobrindo de vergonha o adversário com a própria
constância; outros, semi mortos, eram trancados na prisão onde expiravam
poucos dias depois, sucumbindo às dores; os que sobravam com a saúde
recuperada graças aos cuidados médicos, animavam-se de renovada coragem
com o tempo e o contato com os companheiros de prisão.
Dessa forma, então, quando o edito
imperial concedeu a faculdade de escolher entre aproximar-se dos
sacrifícios ímpios e não serem perturbados, obtendo uma liberdade
criminosa das autoridades do mundo, ou não sacrificar, aceitando a
condenação capital, os cristãos corriam alegres para a morte, sem
nenhuma hesitação.
Eles conheciam, de fato, o que fora
predestinado e anunciado pelas sagradas Escrituras: “Quem sacrificar aos
deuses estranhos – diz o Senhor – será exterminado” (Es 22,19) e “Não
terás outro Deus além de mim” (Ex 20,3)”.
Conclui Santo Eusébio: “São essas
as palavras que o mártir, realmente sábio e amigo de Deus, escrevia do
cárcere aos fiéis da sua igreja, antes da sentença capital, descrevendo a
situação em que se encontrava, e exortando-os a permanecer firmes na fé
em Cristo, mesmo depois da sua morte, que estava próxima” (Eusébio,
História Eclesiástica, l. VIII, c. X).
3.2. Os Mártires da Tebaida (Egito)
”Não há palavras suficientes para
falar das torturas e dores padecidas pelos mártires da Tebaida,
dilacerados no corpo todo com cacos de louça até que expirassem, em
lugar dos ganchos de ferro, e pelas mulheres que, amarradas ao alto por
um pé e, por meio de roldanas, puxadas pela cabeça para baixo, com o
corpo inteiramente nu, oferecendo aos olhares de todos o mais
humilhante, cruel, desumano dos espetáculos.
Outros morriam acorrentados aos
troncos de árvores. Através de mecanismos, os carnífices dobravam,
unindo-os, os ramos mais duros, e amarravam a cada um deles as pernas
dos mártires, deixando, depois, que os ramos voltassem à sua posição
natural, produzindo então um esquartejamento total dos homens contra os
quais eram arquitetados tais suplícios.
Todas essas coisas não aconteceram por
poucos dias ou por breve tempo, mas duraram por um longo período de
anos; todos os dias eram mortas, algumas vezes, mais de dez, outras,
mais de vinte, outras vezes ainda não menos de trinta, ou até mesmo
cerca de sessenta pessoas. Num só dia foram dados à morte,
acertadamente, cem homens com seus filhinhos e mulheres, justiçados
através de um constante seguir-se de refinadas torturas.
Nós mesmos, presentes no lugar da
execução, constatamos que num só dia foram mortas em massa fileiras de
pessoas, em parte decapitadas, em parte queimadas vivas, tão numerosas a
ponto de fazer com que perdesse a força, e até mesmo quebrá-la, a
lâmina de ferro que matava, enquanto os próprios carnífices, cansados,
deviam ser substituídos.
Contemplamos, então, o maravilhoso
vigor, a força verdadeiramente divina e o zelo dos crentes em Cristo,
Filho de Deus. Tão logo, de fato, era pronunciada a sentença contra os
primeiros condenados, outros surgiam de vários lugares diante do
tribunal do juiz declarando-se cristãos, prontos a submeterem-se, sem
sombra de hesitação, às terríveis penas e aos múltiplos gêneros de
tortura que eram preparados contra eles.
Corajosos e intrépidos na defesa da
religião do Deus do universo, acolhiam a sentença de morte com gestos de
alegria e risos de júbilo, a ponto de entoarem hinos e cânticos e
dirigir ações de graças ao Deus do universo, até o momento em que
exalavam o último suspiro.
Realmente maravilhosos esses cristãos,
mas ainda mais maravilhosos os que, gozando no século de uma brilhante
posição devido à riqueza, nobreza, cargos públicos, eloquência, cultura
filosófica, puseram tudo isso depois da verdadeira religião e da fé no
Salvador e Senhor nosso, Jesus Cristo” (Eusébio, História Eclesiástica,
l. VIII, c. 9).
”Foram também admiráveis os que
testemunharam a sua fé na própria terra, onde, homens, mulheres e
crianças, aos milhares, enfrentaram vários gêneros de morte pelo
ensinamento do nosso Salvador.
Alguns foram queimados vivos, depois
de terem sido submetidos a raspagens, ganchos, chicotadas, e outros
milhares de refinadas torturas, terríveis só de ouvir.
Outros foram lançados ao mar, outros ofereceram corajosamente a cabeça aos carnífices, outros morreram durante as próprias torturas ou esgotados pela fome.
Outros foram lançados ao mar, outros ofereceram corajosamente a cabeça aos carnífices, outros morreram durante as próprias torturas ou esgotados pela fome.
Outros ainda foram crucificados, quem
da maneira comum aos ladrões, quem de maneira ainda mais cruel, isto é,
pregados com a cabeça para baixo e vigiados até à morte, ou seja, até
quando morriam de fome nos mesmos patíbulos” (Eusébio, História
Eclesiástica, l. VIII, c. 8).
3.4. Os mártires do Ponto (Ásia Menor)
”Os mártires das cidades do Ponto
padeceram sofrimentos terríveis: alguns tiveram os dedos perfurados com
bambus pontiagudos a partir da extremidade das unhas; para outros,
fazia-se liqüefazer chumbo e, quando a matéria ardia e fervia, era
derramada nas costas da vítima e as partes vitais do corpo eram
queimadas.
Outros sofreram, em seus membros
mais íntimos e nas vísceras, torturas repugnantes, cruéis, intoleráveis
mesmo só de ouvir, que os ilustres juizes, vigilantes da lei, inventavam
cheios de zelo, ostentando toda a própria maldade, como se fosse uma
sabedoria particular, e concorrendo um com o outro na superação de
invenções cruéis, como quem disputa os prêmios de uma competição.
O cúmulo da desventura abateu-se sobre
os cristãos quando as autoridades pagãs, cansadas do excesso dos
massacres e das mortes, saciadas do sangue derramado, assumiram uma
atitude que, segundo eles, era de brandura e benignidade, parecendo que
já não seriam capazes de excogitar algum castigo terrível contra nós.
Não seria justo – diziam eles – manchar cidades inteiras com o sangue de cidadãos, nem agir de modo a culpar de crueldade a suprema autoridade dos soberanos, benévola e branda para com todos; era necessário, contudo, estender a todos o benefício do humano poder imperial, não mais condenando ninguém à morte; pela indulgência dos imperadores foi, de fato, abolida esta pena em relação a nós.
Ordenou-se, então, que se arrancassem os olhos aos nossos irmãos e se lhes estropiasse um perna, porque isso, segundo os pagãos, era um ato de humanidade e a mais leve das penas que se podiam aplicar.
Não seria justo – diziam eles – manchar cidades inteiras com o sangue de cidadãos, nem agir de modo a culpar de crueldade a suprema autoridade dos soberanos, benévola e branda para com todos; era necessário, contudo, estender a todos o benefício do humano poder imperial, não mais condenando ninguém à morte; pela indulgência dos imperadores foi, de fato, abolida esta pena em relação a nós.
Ordenou-se, então, que se arrancassem os olhos aos nossos irmãos e se lhes estropiasse um perna, porque isso, segundo os pagãos, era um ato de humanidade e a mais leve das penas que se podiam aplicar.
Como conseqüência dessa “generosidade”
dos ímpios soberanos, não era possível dizer que se visse uma multidão
de pessoas sem que a espada não tivesse arrancado a alguém o olho
direito e, em seguida, cauterizado. A outros, com ferros em brasa, era
estropiado o pé esquerdo sob a articulação, depois do que eram
destinados às minas de cobre das províncias, não tanto para que pudessem
dar algum rendimento mas para aumentar a miséria e a desventura da
situação deles. Além destes, tão martirizados, havia outros submetidos a
outras provas que nem sequer é possível nomear, porque as “bravuras”
realizadas contra nós superam qualquer descrição.
Distinguindo-se nessas provas sobre
toda a terra, os nobres mártires de Cristo surpreendiam os que foram
testemunhas do seu valor, e através de sua conduta ofereceram provas
evidentes da secreta e realmente divina força do nosso Salvador. Seria
muito longo, para não dizer impossível recordar o nome de cada um”.
(Eusébio, História Eclesiástica, l. VIII, c. 12)
3.5. Martirio di santa Sinforosa e dei suoi sette figli
A construção da vila Adriana em Tívoli
fora concluída em 135 e, deve-se remontar a essa época o martírio de
Santa Sinforosa, sacrificada como vítima propiciatória nos “habituais
nefandos ritos pagãos” de consagração da vila imperial.
O trecho que fala do seu martírio
mostra um imperador Adriano mal disposto em relação ao cristianismo
(passaram-se os tempos das pacatas instruções ao procônsul Minúcio
Fundanos) e propenso a crer nas calúnias dos sacerdotes pagãos.
O próprio imperador, não um seu
funcionário, chama aquela mulher, e procura induzi-la a renegar a fé,
fazendo o mesmo com seus filhos.
”O imperador Adriano fizera
construir um palácio para si e queria consagrá-lo com os habituais
nefandos ritos pagãos. Começou a pedir, com sacrifícios, aos ídolos e
demônios, que neles habitam, a resposta dos oráculos, e esta foi a
resposta: “A viúva Sinforosa, com seus sete filhos, aflige-nos todos os
dias invocando o seu Deus. Se ela com seus sete filhos sacrificarem
segundo o nosso rito, nós vos prometemos conceder tudo o que pedis”.
Adriano, então, mandou prende-la com
os filhos e, de maneira insinuante, exortou-os a sacrificar aos deuses.
Sinforosa, porém, disse-lhe: “Meu esposo Getúlio e seu irmão Amâncio,
quando combatiam no teu exército como tribunos, enfrentaram muitos
gêneros de tortura por não aceitarem sacrificar aos ídolos e, como
atletas valorosos, venceram os demônios com a própria morte.
Preferiram, de fato, ser decapitados a
deixar-se vencer, sofrendo a morte que, aceita em nome de Cristo,
trouxe-lhes ignomínia no mundo dos homens ligados aos interesses
terrenos, mas deu-lhes honra e glória eterna na assembléia dos anjos.
Vivem agora entre os anjos e, levantando os troféus da própria paixão,
gozam no céu da vida eterna com o eterno rei”.
O imperador respondeu a Santa
Sinforosa: “Ou sacrificas com teus filhos aos deuses onipotentes, ou
farei imolar-te com teus filhos”.
Acrescentou, em seguida, santa
Sinforosa: “Donde vem-me a graça de merecer ser oferecida com os meus
filhos como vítima a Deus?”. E o Imperador: “Eu te farei sacrificar aos
meus deuses”.
A bem-aventurada Sinforosa respondeu:
“Teus deuses não podem aceitar-me em sacrifício, mas se for imolada em
nome de Cristo meu Deus, eu terei o poder de fazer com teus demônios se
tornem cinzas”.
Disse, então, o imperador: “Escolhe uma das duas propostas: ou sacrificas aos meus deuses ou morrerás de morte trágica”.
Sinforosa, então, respondeu: “Crês que
possa mudar o meu propósito por um temor qualquer, enquanto o meu
desejo mais vivo é repousar em paz junto do meu esposo Getúlio, que
fizeste morrer pelo nome de Cristo?”.
O imperador Adriano, então, mandou-a
levar ao templo de Hércules e ali primeiramente fez com que fosse
esbofeteada, depois dependurada pelos cabelos. Vendo, contudo, que de
modo algum e com nenhuma ameaça conseguia demove-la do seu propósito,
mandou atar-lhe uma pedra ao pescoço e afogá-la no rio. Seu irmão
Eugênio, que tinha um cargo na cúria de Tívoli, recolheu o seu o corpo e
sepultou-o na periferia daquela cidade.
No dia seguinte, o imperador Adriano
mandou chamar à sua presença os seus sete filhos ao mesmo tempo. Quando
viu que de modo algum, nem com promessas nem com ameaças, conseguia
levá-los a sacrificar aos deuses, mandou levantar sete postes ao redor
do templo de Hércules e, com a ajuda de máquinas, fez afligir os jovens.
Em seguida mandou matá-los: Crescente, trespassado no pescoço; Juliano,
no peito; Nemésio no coração; Primitivo, no umbigo; Justino, nas
costas; Estacteno, no peito; Eugênio foi esquartejado da cabeça aos pés.
O imperador Adriano, retornando ao
templo de Hércules do dia seguinte, mandou levar seus corpos embora e
lançá-los numa fossa profunda, numa localidade que os pontífices
chamaram: “Aos sete justiçados”.
Houve, depois disso, trégua de um ano e
seis meses na perseguição; foi dada, nesse tempo, uma sepultura honrosa
aos corpos dos mártires e foram construídas sepulturas para aqueles
cujos nomes estão inscritos no livro da vida.
O dia natalício dos santos mártires
Sinforosa e seus sete filhos é celebrado 15 dias antes das calendas de
agosto (17 de julho). Seus corpos repousam na via Tiburtina, a cerca de
oito milhas de Roma, sob o reinado de nosso Senhor Jesus Cristo, a quem
são devidas honra e glória nos séculos dos séculos. Amém”.
3.6. Martírio dos santos Ptolomeu, Lúcio e outro desconhecido
O trecho seguinte é tirado da segunda
Apologia de Justino, que lhe foi inspirada pelo processo contra três
cristãos, realizado em Roma em 162 ou 163 sob o prefeito Úrbico. Pouco
posterior ao episódio, a narração é densa, sem divagações ou ornamentos
retóricos, fazendo brotar, porém, da trama pobre, a calorosa defesa do
cristianismo.
Porque condenar pessoas cuja fé
traduz-se numa regra de vida austera e na recusa de qualquer culpa
contra a natureza? É este o sentido das palavras do mártir Lúcio, e é
este o espírito de Justino, que poucos anos depois teria, também ele,
confirmado a fé com o sangue.”Vivia uma mulher, esposa de um homem
dissoluto, também ela anteriormente dissoluta. Entretanto, quando veio
ao conhecimento dos ensinamentos de Cristo, não só começou a levar uma
vida mais pura, como tentou convencer igualmente o marido a
converter-se, falando-lhe da nova doutrina e anunciando-lhe o castigo do
fogo eterno para todos os que levam uma vida impura e sem princípios
retos.
O marido, porém, persistindo nos maus
procedimentos, fez com que o espírito da mulher se afastasse pela sua má
conduta, de modo que ela, considerando imoral viver o resto de seus
dias ao lado de um homem que buscava o prazer das relações conjugais
contra as leis da natureza e contra a justiça, decidiu separar-se dele.
Foi dissuadida pelos parentes, que lhe
aconselhavam ter ainda paciência, na esperança de que o marido mudasse
de vida: ela, pois, conseguiu forças e permaneceu ao seu lado.
Foi-lhe referido, em seguida, que o
mariano, tendo ido a Alexandria, cometia culpas ainda mais graves do que
no passado; a mulher não querendo tornar-se cúmplice de sua maldade e
impiedade permanecendo junto dele como esposa, dividindo com ele o leito
e as refeições, deu-lhe aquilo que chamais de “libelo de repúdio”, e
divorciou-se.
O cavalheiro do marido, em lugar de
alegrar-se pelo fato de a mulher – que antes se entregava aos servos e
mercenários nas orgias da bebedeira, ter abandonado aqueles hábitos
culpáveis e querer levá-lo também a fazer o mesmo -, despeitado com o
divórcio obtido sem o seu consentimento, denunciou-a diante do tribunal
como cristã.
A mulher, senhor, apresentou-te,
então, um memorial em que pedia, antes de tudo, que lhe fosse concedida a
administração dos próprios bens e, em seguida, a defesa da acusação,
depois de ter sabiamente organizado suas coisas, e tu lhe concedeste.
O marido, não podendo agir contra a
mulher, voltou a acusação contra um certo Ptolomeu, mestre dela na
doutrina cristã. Foi essa a sua tática: persuadir um centurião seu
amigo, que colocara Ptolomeu na prisão, a pegá-lo de surpresa e
fazer-lhe esta simples pergunta: “És cristão?”.
Ptolomeu admitiu sê-lo, sincero e sem
qualquer subterfúgio que era, levando o centurião a mandar acorrentá-lo e
torturá-lo por longo tempo na prisão.
Finalmente, quando o homem foi levado
diante de Úrbico, foi-lhe dirigida a mesma pergunta, ou seja, se era
cristão. Ptolomeu, novamente, consciente do bem que lhe vinha do
ensinamento de Cristo, confessou que era mestre da divina virtude.
Quem, de fato, nega qualquer verdade
que seja, nega-a porque a despreza ou porque recusa reconhece-la
considerando-se indigno e distante dos deveres que ela comporta; nenhuma
dessas duas atitudes, porém, refere-se ao cristão sincero.
Quando Úrbico ordenou que Ptolomeu
fosse levado ao suplício, um certo Lúcio, também cristão, vendo a
insensatez de um processo conduzido dessa forma, gritou a Úrbico: “Qual o
motivo pelo qual condenaste à morte este homem, não culpado de
adultério, nem de fornicação, nem de assassinato, nem de furto, nem de
rapina, nem de qualquer outro delito, mas apenas de ter-se confessado
cristão? O teu modo de julgar, Úrbico, é indigno do imperador Antonino
Pio, indigno do filho de César, amigo da sabedoria, indigno, enfim, do
santo senado!”.
Sem pronunciar resposta, Úrbico disse a
Lúcio: “Parece-me que tu também és cristão”. Visto que Lúcio concordou
calorosamente, Úrbico fê-lo levar ao suplício. O mártir declarou que era
uma graça para ele, porque sabia que deixava o mundo dos malvados pela
morada do Pai celeste. Um terceiro (homem) também veio para declarar-se
cristão e foi igualmente condenado à morte”.
3.7. Martírio de São Máximo, sob o império de Décio (249-251)
Máximo era um cristão da Ásia Menor,
que nos é conhecido pelo documento do seu martírio. Ele denunciara-se
voluntariamente como cristão, com uma atitude que a Igreja não aprovava
totalmente, mas foi corajoso e superou a prova.
”O imperador Décio, querendo
expulsar e abater a lei dos cristãos, emanou alguns editos para o orbe
todo, nos quais intimava que todos os cristãos abandonassem o Deus vivo e
verdadeiro e sacrificassem aos demônios; quem não quisesse obedecer,
devia submeter-se aos suplícios.
Naquele tempo, Máximo, homem santo e
fiel ao Senhor, declarou-se espontaneamente cristão: ele era um plebeu e
exercia o comércio. Preso, foi levado diante do procônsul Ótimo, na
Ásia.
O procônsul perguntou-lhe: “Como te chamas?”.
Ele respondeu: “Chamo-me Máximo”.
Perguntou o procônsul: “Qual é a tua condição?”
Máximo respondeu: “Nascido livre, mas servo de Cristo”.
Perguntou ainda o procônsul: “Quais as atividades que exerces?”
Respondeu Máximo: “Sou plebeu e vivo do meu comércio”.
Disse o procônsul: “És cristão?”
Respondeu Máximo: ” Embora pecador, sou cristão”.
Disse o procônsul: “Não conheces os decretos dos invencíveis soberanos que foram promulgados recentemente?”
Respondeu Máximo: “Quais decretos?”
Ele respondeu: “Chamo-me Máximo”.
Perguntou o procônsul: “Qual é a tua condição?”
Máximo respondeu: “Nascido livre, mas servo de Cristo”.
Perguntou ainda o procônsul: “Quais as atividades que exerces?”
Respondeu Máximo: “Sou plebeu e vivo do meu comércio”.
Disse o procônsul: “És cristão?”
Respondeu Máximo: ” Embora pecador, sou cristão”.
Disse o procônsul: “Não conheces os decretos dos invencíveis soberanos que foram promulgados recentemente?”
Respondeu Máximo: “Quais decretos?”
Explicou o procônsul: “Os que ordenam
que todos os cristãos, abandonando sua vã superstição, reconheçam o
verdadeiro soberano ao qual tudo é submetido, e adorem os seus deuses”.
Respondeu Máximo: “Cheguei ao
conhecimento do iníquo edito emanado pelo soberano deste mundo e,
justamente por isso, declarei-me publicamente cristão”. O procônsul
intimou: “Sacrifica, então, aos deuses!”
Máximo replicou: “Eu não sacrifico a não ser ao único Deus, e glorio-me de ter sacrificado a ele desde a infância”.
O procônsul insistiu: “Sacrifica, para
que sejas salvo. Se te recusares, eu te farei morrer em meio a torturas
de todos os gêneros”.
Máximo respondeu: “É justamente o que
sempre desejei: é por isso, de fato, que me declarei cristão, para obter
finalmente a vida eterna, logo que for libertado desta mísera
existência temporal”.
O procônsul, então, fê-lo bater com
varas e, enquanto era vergastado, dizia-lhe: “Sacrifica, Máximo, para
libertar-te destes tormentos horrorosos”.
Máximo respondeu: “Não são tormentos,
mas unções que me são infligidas por amor de nosso senhor Jesus Cristo.
Se afastar-me dos preceitos do meu Senhor, nos quais fui instruído por
meio do seu evangelho, então sim, estarão esperando-me os verdadeiros e
perpétuos tormentos da eternidade”.
O procônsul fê-lo colocar, então, no
cavalete e, enquanto era torturado, dizia-lhe insistentemente:
“Arrepende-te da tua loucura, miserável, e sacrifica, para salvar a tua
vida!”
Máximo respondeu: “Só se não
sacrificar, salvarei a minha vida; mas se sacrificar, seguramente a
perderei. Nem as varas, nem os ganchos, nem o fogo me produzirão dor,
porque vive em mim a graça de Deus, que me salvará eternamente com as
orações de todos os santos que, lutando neste gênero de combate,
superaram a vossa loucura e nos deixaram nobres exemplos de valor”.
Depois destas palavras, o procônsul
pronunciou a sentença contra ele, dizendo: “A divina clemência ordenou
que, para incutir terror nos demais cristãos, seja lapidado o homem que
não quiser dar o próprio assentimento às sagradas leis, que lhe impõem
sacrificar à grande deusa Diana”.
O atleta de Cristo foi arrastado para
fora, então, pelos ministros do diabo, enquanto dava graça a Deus Pai
por Jesus Cristo seu Filho, que o tinha julgado digno de superar o
demônio na luta.
Levado para fora das muralhas, esmagado pelas pedras, exalou o espírito.
O servo de Deus Máximo padeceu o martírio na província da Ásia dois dias antes dos idos de maio, durante o império de Décio e o governo do procônsul Ótimo, reinando nosso Senhor Jesus Cristo, ao qual é dada glória nos séculos dos séculos. Amém”.
O servo de Deus Máximo padeceu o martírio na província da Ásia dois dias antes dos idos de maio, durante o império de Décio e o governo do procônsul Ótimo, reinando nosso Senhor Jesus Cristo, ao qual é dada glória nos séculos dos séculos. Amém”.
3.8. Martírio dos Santos Silitanos (na Numídia, – África setentrional)
O processo contra os cristãos de
Sílio aconteceu no verão de 180 d.C., quando Cômodo era imperador há
poucos meses, e pode ser considerado como continuação das perseguições
iniciadas sob o predecessor Marco Aurélio. A fé cristã já estava
difundida provavelmente na África proconsular, tendo chegado também aos
pequenos centros: Sílio era, justamente, um vilarejo da Numídia.
O texto latino do qual se apresenta a
tradução é contemporâneo aos fatos; talvez seja a própria ata do
processo, à qual foi acrescentada pelo transcritor apenas a última
parte. É o primeiro documento sobre o tributo de sangue que os cristãos
da África versaram à Igreja.
”Dezesseis dias antes das calendas
de agosto (17 de julho), quando eram Procônsules Presente, pela segunda
vez, e Claudiano, foram convocados à autoridade judiciária Esperado,
Narsalo, Citino, Donata, Segunda e Véstia.
O procônsul Saturnino disse-lhes: “Podeis merecer a indulgência do nosso soberano, se retornardes a pensamentos de retidão”.
O procônsul Saturnino disse-lhes: “Podeis merecer a indulgência do nosso soberano, se retornardes a pensamentos de retidão”.
Respondeu Esperado: “Nada fizemos de
mal, nem cometemos qualquer iniquidade, nem falamos mal de alguém, pelo
contrário sempre retribuímos o mal com o bem; por isso obedecemos ao
nosso imperador”.
Disse ainda o procônsul Saturnino:
“Nós também somos religiosos, e a nossa religião é simples. Juramos pelo
gênio do nosso soberano e fazemos súplicas aos deuses pela sua
salvação, coisa que vós também deveis fazer”.
Respondeu Esperado: “Se me escutares com calma, eu te explicarei o mistério da simplicidade”.
Saturnino rebateu: “Não te escutarei nesta iniciação em que ofendes os nossos ritos; jurai, entretanto, pelo gênio do nosso soberano”.
Saturnino rebateu: “Não te escutarei nesta iniciação em que ofendes os nossos ritos; jurai, entretanto, pelo gênio do nosso soberano”.
Respondeu Esperado: “Eu não conheço o
poder do século, mas estou sujeito àquele Deus que nenhum homem viu nem
pode ver com seus olhos. Jamais cometi um furto, mas toda vez que
concluo um negócio pago sempre o tributo, porque obedeço ao meu soberano
e imperador dos reis de todos os séculos”.
O procônsul Saturnino disse aos outros: “Desisti dessa convicção”.
Esperado rebateu: “Trata-se de um mau sistema o fato de ameaçar de morte se não se jura em falso”.
Esperado rebateu: “Trata-se de um mau sistema o fato de ameaçar de morte se não se jura em falso”.
Disse ainda o procônsul Saturnino: “Não consintais nessa loucura”.
Disse Citino: “Não temos nada a temer de ninguém a não ser de nosso Senhor que está nos céus”. Acrescentou Donata: “Honra a César, como soberano, mas temor somente a Deus”.
Disse Citino: “Não temos nada a temer de ninguém a não ser de nosso Senhor que está nos céus”. Acrescentou Donata: “Honra a César, como soberano, mas temor somente a Deus”.
Véstia continuou: “Sou cristã”.
Disse Segunda: “Aquilo que sou, quero ser”.
O procônsul Saturnino perguntou a Esperado: “Persistes em declarar-te cristão?”
Esperado respondeu: “Sou cristão” e todos concordaram com suas palavras.
O procônsul Saturnino perguntou, então: “Quereis um pouco de tempo para decidir?”
Respondeu Esperado: “Numa questão tão claramente justa, a decisão já está tomada”.
Disse Segunda: “Aquilo que sou, quero ser”.
O procônsul Saturnino perguntou a Esperado: “Persistes em declarar-te cristão?”
Esperado respondeu: “Sou cristão” e todos concordaram com suas palavras.
O procônsul Saturnino perguntou, então: “Quereis um pouco de tempo para decidir?”
Respondeu Esperado: “Numa questão tão claramente justa, a decisão já está tomada”.
Perguntou então o procônsul Saturnino: “O que há em vossa caixinha?”
Esperado respondeu: “Livros e as cartas de São Paulo, homem justo”.
Disse o procônsul: “Tendes uma prorrogação de trinta dias para refletir.
Esperado respondeu: “Sou cristão”, e todos estiveram de acordo com ele.
Esperado respondeu: “Livros e as cartas de São Paulo, homem justo”.
Disse o procônsul: “Tendes uma prorrogação de trinta dias para refletir.
Esperado respondeu: “Sou cristão”, e todos estiveram de acordo com ele.
O procônsul Saturnino leu o decreto do
ato: “Decreta-se que sejam decapitados Esperado, Narsalo, Citino,
Donata, Véstia, Segunda e todo os outros que declararam viver segundo a
religião cristã, porque, embora tenha sido dada a eles a faculdade de
retornar às tradições romanas, recusaram-na obstinadamente”. Esperado
disse: “Damos graças a Deus”. Narsalo acrescentou: “Hoje seremos
mártires no céu. Sejam dadas graças ao Senhor!”.
O procônsul Saturnino mandou proclamar
a sentença pelo pregoeiro: “Foram condenados à pena capital: Esperado,
Narsalo, Citino, Vetúrio, Félix, Aquilino, Letâncio, Genara, Generosa,
Véstia, Donata, Segunda”.
Todos disseram: “Sejam dadas graças a Deus!”, e foram em seguida degolados pelo nome de Cristo”.
Todos disseram: “Sejam dadas graças a Deus!”, e foram em seguida degolados pelo nome de Cristo”.
3.9. Os mártires de Alexandria durante a perseguição de Décio (249-251)
De uma carta de São Dionísio a Fábio,
bispo de Antioquia, trazida por Eusébio de Cesaréia na História
Eclesiástica, l. VI, c. 40,1-42,6.”A perseguição, entre nós, não teve
início com o edito imperial, mas foi retardada de um ano, até quando
chegou a esta cidade um adivinhador e tecelão de erros, quem quer que
fosse, provocando e excitando contra nós a multidão dos gentios,
atiçando outra vez a sua superstição congenial.
Excitados por ele e levados a tirar da
licenciosidade desenfreada todo gênero de impiedade, consideravam
assassinar-nos como o único ato de devoção e culto que lhes era devido.
A primeira vítima foi um velho chamado Metras, que capturaram e tentaram obrigar a blasfemar; como ele não se rendesse a suas imposições, bateram nele e atravessaram seu rosto e olhos com bambus aguçados, levando-o depois à periferia da cidade onde delapidaram-no.
Uma mulher chamada Quinta foi levada até diante do altar dos ídolos, onde os pagãos tentaram obrigá-la a um ato de adoração: tão logo ela retesou o corpo com profunda sensação de desgosto, foi amarrada e arrastada pelos pés através da cidade, fazendo com que batesse contra as grandes pedras do duro calçamento. Levando-a ao mesmo lugar suburbano, delapidaram-na.
Depois disso os pagãos lançaram-se juntos sobre as casas dos cristãos e, irrompendo nas residências que cada um sabia pertencer aos próprios vizinhos, cumpriram toda sorte de roubos e saques. Separavam cuidadosamente os objetos mais preciosos, e jogavam das janelas e queimavam pelas ruas os mais rudes e os que eram feitos de madeira.
O espetáculo apresentado parecia o de uma cidade tomada pelos inimigos. Os irmãos procuravam fugir e esconder-se, e acolheram com alegria também o saque de seus bens, semelhantes àqueles dos quais deram testemunho o apóstolo Paulo (Hb 10,34).
Não sei se houve naquela circunstância, alguém que renegasse a Cristo, a menos que se tratasse de uma pessoa caída nas garras dos adversários.
Outra nobilíssima vítima foi a anciã Apolônia: os pagãos prenderam-na, fizeram arrancar todos os seus dentes, com murros dados nas faces e, depois, acesa uma fogueira diante da cidade, ameaçaram queimá-la viva caso não pronunciasse com eles as palavras ímpias, que eram a mensagem da blasfêmia pagã.
A mulher, porém, depois de ter pedido vivamente que lhe deixassem à disposição um breve tempo, tão logo viu-se livre saltou sobre o fogo e foi queimada. Serapião foi preso em casa: submeteram-no a duros tormentos, quebraram-lhe os ossos e finalmente lançaram-no de cabeça do andar superior.
Não se podia percorrer nenhuma rua, larga ou estreita, de noite ou de dia, sem ouvir sempre e em todos os lugares as gritarias da multidão e, se alguém não entoava em coro com eles as palavras ímpias, era arrastado e queimado vivo.
A perseguição continuou por muito tempo nesse tom de violência, até quando a sedição e a guerra civil, que sucederam às desventuras anteriores, não levaram os pagãos a voltar-se reciprocamente a crueldade que antes tinham dirigido sobre nós.
Vivemos tranqüilos por algum tempo, durante a trégua que os pagãos tinham feito ao ódio contra nós, mas bem logo foi-nos anunciada a notícia da mudança do poder imperial, antes muito benévolo, e reacendeu-se com a máxima intensidade o terror de uma nova ameaça contra a nossa comunidade.
Foi promulgado o edito, talvez o mais terrível de todos os que nosso Senhor tinha predito, a ponto de escandalizar, se for possível, também os eleitos. É certo que todos ficaram arrasados. Entre as pessoas mais conhecidas na cidade alguns, por medo, aderiram às ordens do edito, outros, que cobriam encargos públicos, foram levados a obedecer ao edito da sua própria posição, outros ainda foram arrancados à vida familiar.
A primeira vítima foi um velho chamado Metras, que capturaram e tentaram obrigar a blasfemar; como ele não se rendesse a suas imposições, bateram nele e atravessaram seu rosto e olhos com bambus aguçados, levando-o depois à periferia da cidade onde delapidaram-no.
Uma mulher chamada Quinta foi levada até diante do altar dos ídolos, onde os pagãos tentaram obrigá-la a um ato de adoração: tão logo ela retesou o corpo com profunda sensação de desgosto, foi amarrada e arrastada pelos pés através da cidade, fazendo com que batesse contra as grandes pedras do duro calçamento. Levando-a ao mesmo lugar suburbano, delapidaram-na.
Depois disso os pagãos lançaram-se juntos sobre as casas dos cristãos e, irrompendo nas residências que cada um sabia pertencer aos próprios vizinhos, cumpriram toda sorte de roubos e saques. Separavam cuidadosamente os objetos mais preciosos, e jogavam das janelas e queimavam pelas ruas os mais rudes e os que eram feitos de madeira.
O espetáculo apresentado parecia o de uma cidade tomada pelos inimigos. Os irmãos procuravam fugir e esconder-se, e acolheram com alegria também o saque de seus bens, semelhantes àqueles dos quais deram testemunho o apóstolo Paulo (Hb 10,34).
Não sei se houve naquela circunstância, alguém que renegasse a Cristo, a menos que se tratasse de uma pessoa caída nas garras dos adversários.
Outra nobilíssima vítima foi a anciã Apolônia: os pagãos prenderam-na, fizeram arrancar todos os seus dentes, com murros dados nas faces e, depois, acesa uma fogueira diante da cidade, ameaçaram queimá-la viva caso não pronunciasse com eles as palavras ímpias, que eram a mensagem da blasfêmia pagã.
A mulher, porém, depois de ter pedido vivamente que lhe deixassem à disposição um breve tempo, tão logo viu-se livre saltou sobre o fogo e foi queimada. Serapião foi preso em casa: submeteram-no a duros tormentos, quebraram-lhe os ossos e finalmente lançaram-no de cabeça do andar superior.
Não se podia percorrer nenhuma rua, larga ou estreita, de noite ou de dia, sem ouvir sempre e em todos os lugares as gritarias da multidão e, se alguém não entoava em coro com eles as palavras ímpias, era arrastado e queimado vivo.
A perseguição continuou por muito tempo nesse tom de violência, até quando a sedição e a guerra civil, que sucederam às desventuras anteriores, não levaram os pagãos a voltar-se reciprocamente a crueldade que antes tinham dirigido sobre nós.
Vivemos tranqüilos por algum tempo, durante a trégua que os pagãos tinham feito ao ódio contra nós, mas bem logo foi-nos anunciada a notícia da mudança do poder imperial, antes muito benévolo, e reacendeu-se com a máxima intensidade o terror de uma nova ameaça contra a nossa comunidade.
Foi promulgado o edito, talvez o mais terrível de todos os que nosso Senhor tinha predito, a ponto de escandalizar, se for possível, também os eleitos. É certo que todos ficaram arrasados. Entre as pessoas mais conhecidas na cidade alguns, por medo, aderiram às ordens do edito, outros, que cobriam encargos públicos, foram levados a obedecer ao edito da sua própria posição, outros ainda foram arrancados à vida familiar.
Chamados pelos nomes, alguns
apresentavam-se pálidos e trementes diante dos sacrifícios ímpios e
sacrílegos, como se não fossem sacrificar, mas fossem eles próprios as
vítimas destinadas aos ídolos; entretanto a multidão girava ao redor dos
altares pagãos fazendo burla sobre eles, porque mostravam claramente
estar com medo, tanto da morte como do sacrifício.
Outros, porém, corriam intrépidos aos
altares, declarando com desfaçatez que não eram cristãos e nem sequer o
tinham sido no passado. Será verdade para eles a predição do senhor, que
dificilmente se salvarão.
Dos restantes, houve quem agregou-se
ao primeiro grupo, quem ao segundo, enquanto outros fugiram. Entre os
que foram presos, uma parte resistiu ao cárcere e às correntes em que
foram mantidos por muitos dias, mas depois abjuraram, antes de se
apresentarem ao tribunal; outra parte suportou os tormentos também por
um certo tempo, mas acabaram abjurando também eles.
Outros cristãos, entretanto, colunas
sólidas e prósperas do Senhor, corroborados pela sua graça, tiraram a
constância e a energia da fé que os inspirava tornando-se, assim,
testemunhas admiráveis do seu reino”.
3.10. São Marino, centurião sob Galieno
Pode parecer estranho falar de um
mártir sob o imperador Galieno (260-268), que não perseguiu os cristãos,
e, pelo contrário, facilitou-lhes a vida, revogando os editos e
restituindo os bens confiscados, como diz Eusébio num outro ponto do
mesmo livro VII da História Eclesiástica.
Marino, de fato, não foi vítima de uma perseguição organizada, mas da rivalidade de um competidor na carreira militar.
Nobre, rico, tendo chegado a um alto
grau da jerarquia, Marino talvez tenha tido um momento de hesitação
diante da intimação do juiz, tanto que usou o tempo que lhe fora
concedido para refletir, diversamente de muitos outros que, em situações
semelhantes, tinham tomado logo a resolução de enfrentar o martírio,
mas, oportunamente acompanhado pelas palavras do seu bispo, não teve
mais incertezas.
O fato é muito importante, porque
permite compreender que, mesmo quando não havia uma perseguição oficial,
ficavam sempre latentes as razões de dissídio entre a estrutura
político-moral-religiosa do império romano e os princípios do
cristianismo.”Durante o tempo em que a paz reinava em todos os lugares
nas igrejas cristãs, foi decapitado na Cesaréia da Palestina por ter
confessado sua fé, Marino, que pertencia aos altos graus da jerarquia
militar e era ilustre pela nobreza e riqueza.
A causa da condenação foi a seguinte: existe entre os romanos um distintivo formado por um ramo de videira, e o merecedor dele torna-se centurião.
A causa da condenação foi a seguinte: existe entre os romanos um distintivo formado por um ramo de videira, e o merecedor dele torna-se centurião.
Como havia um lugar vago, a promoção
cabia de direito a Marino, mas, quando já estava para conseguir tal
honra, apresentou-se um outro ao tribunal, dizendo que, segundo as
antigas leis, não lhe era lícito receber qualquer honorificência dos
romanos, porque era cristão e não sacrificava aos deuses; o indivíduo
sustentou, então que o lugar cabia a ele e não a Marino.
Impressionado pelo fato, o juiz, que
se chamava Arqueo, perguntou primeiramente a Marino qual a religião que
seguia e, quando ouviu-o confessar-se firmemente cristão, concedeu-lhe
três horas de tempo para refletir.
Quando Marino saiu do tribunal, Teotécno, bispo de Cesaréia, chamou-o para uma conversa, tomou-o pelas mãos e levou-o à igreja.
Quando Marino saiu do tribunal, Teotécno, bispo de Cesaréia, chamou-o para uma conversa, tomou-o pelas mãos e levou-o à igreja.
Tão logo chegaram ao lugar sagrado, o
bispo acompanhou Marino até diante do altar, levantou um pouco o seu
manto e, indicando-lhe a espada que aí estava presa, colocou ao lado
dela o livro do Evangelho, impondo-lhe a escolha entre as duas coisas
segundo a sua consciência.
Sem sombra de incerteza, Marino
estendeu a mão direita e segurou a divina Escritura. “Permanece sempre
junto do Senhor – disse-lhe Teotécno – e obterás o que escolheste.
Fortificado pela sua graça, vai em paz”.
Enquanto Marino saía da igreja, o
pregoeiro chamava-o em voz alta diante do tribunal, porque havia
terminado o tempo concedido para a decisão.
Diante do juiz, Marino mostrou grande fervor em confessar a própria fé e, levado ao suplício do modo que estava, consumou o martírio.
Diante do juiz, Marino mostrou grande fervor em confessar a própria fé e, levado ao suplício do modo que estava, consumou o martírio.
Recordam-se também na mesma
circunstância a franqueza e o fervor religioso de Astírio, que pertencia
à ordem senatorial, estava em relações de amizade cordial com os
soberanos e era conhecido de todos pela nobreza e pelos bens.
Estando presente ao martírio de
Marino, tão logo este foi consumado, levantou o cadáver, carregou-o nos
ombros, sobre a veste cândida e preciosa, e levou-o para que tivesse uma
sepultura honrosa, digna da sua condição”. (Eusébio, História
Eclesiástica, l. VII, c. 15 e ss.)
Continua na 2ª parte
Fonte: Ultimas misericórdias
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe uma mensagem!!!